5 coisas que as pessoas que não têm filhos querem que você saiba

Por Elizabeth Costa

Enquanto mais americanos optam por não ter filhos e mais celebridades falam com franqueza sobre suas próprias decisões, pesquisadores começaram a debruçar-se sobre algumas perguntas: Quem tem mais chances de não ter filhos? Por que as pessoas optam por não ter filhos? Como as outras pessoas enxergam os casais sem filhos?

Os dados de pesquisas raramente distinguem entre as pessoas que não têm filhos por opção própria e as que não as têm por motivos que vão além da sua vontade. Os dados do censo de 2014 revelam que 47,6% das mulheres de 15 a 44 anos nunca tiveram filhos – o índice mais alto jamais verificado. Já o relatório de 2014 do centro Pew, 19% das mulheres de 40 a 44 anos de idade continuam sem filhos.

Um novo estudo analisou como as pessoas chegam a essa decisão. Ele revela que a decisão raramente é fruto de uma discussão única, como haviam sugerido pesquisas anteriores, mas sim de uma discussão contínua que a pessoa tem com ela mesma e com seu parceiro.

A socióloga de gênero Amy Blackstone, da Universidado do Maine, é especializada em pesquisas sobre pessoas sem filhos e espera que seu estudo ajude a questionar a ideia preconcebida de que as crianças vão crescer e virar pais. Derrotar essa premissa lhes dará o espaço necessário para decidirem, quando adultas, se ser pais, elas próprias, é ou não a escolha certa para elas.

“No momento, meninos e meninas, mas especialmente as meninas, são criados para imaginar-se como pais de filhos. Mas, se refletíssemos mais criticamente sobre a questão de ter ou não ter filhos, cada pessoa teria a oportunidade de fazer a escolha mais acertada para ela. É claro que os casais sem filhos se beneficiariam se isso virasse uma escolha, e não uma premissa. Mas acho que os pais também se beneficiariam.”

Blackstone fez um estudo qualitativo para explorar como 31 pessoas (21 mulheres e dez homens, sendo 29 heterossexuais e 2 homossexuais) tomaram a decisão de não ter filhos. Ela fez entrevistas de 60 a 90 minutos de duração com as pessoas sobre como tomaram a decisão, a reação que dos outros e suas reflexões sobre a escolha feita.

A descoberta dela de que a escolha de não ter filhos não é feita de modo superficial, mas é fruto de uma discussão complexa e contínua, rebate as críticas de que as pessoas que optam por não ter filhos seriam egoístas ou frívolas.

E ela mostra como homens e mulheres encaram essa escolha, além de lançar luz sobre o modo como amigos e familiares ajudam a moldar a decisão das pessoas.

Leia abaixo cinco observações tiradas do estudo de Blackstone, apresentadas nas próprias palavras dos participantes e mostrando suas razões para não ter filhos. Todos os nomes são pseudônimos.

1. A decisão de não ter filhos não é algo impensado ou superficial.

 

“Acho que desde sempre eu decidi que não queria ter filhos.” – Annie

“Acho que todo o mundo pode dizer que chegar a onde estamos hoje [e conservar nossa situação de sem filhos] tem sido um processo decisório constante, porque em cada relacionamento que você inicia, especialmente sendo romântico, espera-se que haja filhos. Você refaz constantemente a decisão de continuar sem filhos.” – Janet

“Não é uma decisão do tipo ‘ok, hoje é o dia que eu não quero filhos’. É uma decisão que pode ser revertida, que é válida hoje.” – April

“Meu parceiro e eu discutimos: ‘Você quer ter filhos, ou não?’. O tempo está passando… e a gente vê as coisas que são importantes para nós e o jeito como queremos viver nossas vidas. Vemos que uma criança representaria uma virada total.” – Sarah

“Acho que essa é uma decisão que já tomamos mais de uma vez. Sabe, em momentos diferentes da vida. Estamos juntos há 18 anos agora. Acho que a cada cinco ou seis anos o tema dos filhos ressurge, e acho que provavelmente vai continuar a reaparecer agora, em vista da idade em que estamos.

Um de nós fala ‘e aí, agora você quer filhos?’, e o outro responde ‘na realidade, não’. ‘Está acontecendo alguma coisa que nos pode fazer querer filhos?’. ‘Não. Não.’” – Robin

2. As pessoas que decidem não ter filhos já observaram de perto pessoas com filhos e não gostaram do que viram..

 

“Cresci imaginando que teria filhos. Eu pensava que você se casava e isso acontecia. Mas tenho irmãs mais velhas, e notei que minhas duas irmãs bem mais velhas adiaram por muito tempo a hora de ter filhos. Assim, ficou claro para mim que ter filhos é uma escolha, não é uma coisa inevitável.

“Então minhas duas irmãs mais novas engravidaram acidentalmente e vi como isso complicou a vida delas. Elas não tinham bons empregos e seus companheiros, também não.

Elas tiveram que fazer de tudo para se virar, e mesmo hoje, 20 anos mais tarde, é só agora que estão finalmente conseguindo começar a viver suas vidas.

E assim, pouco a pouco fui pensando ‘não vou ter filhos’. Pouco a pouco concluí ‘acho que não preciso de filhos’.” – Steve

“Acho que é em parte porque, quando minhas amigas começaram a ter filhas, eu pensei ‘ahn, acho que isso não é para mim’. Porque, mesmo que eu realmente quisesse ter filhos antes, vi que minhas amigas que estavam tendo filhos perdiam sua liberdade e individualidade, que é realmente importante para mim.

Não era bem aquela coisa divertida, de família que você pensa que é, quando é mais jovem. Foi quando minhas amigas começaram a ter filhos que eu comecei a pensar ‘não vou entrar nessa’.” – Janet

“Eu observava as famílias em volta e me perguntava se queria fazer parte daquela dinâmica no nosso mundo. Muitas pessoas com filhos não tinham cara de felizes. A maioria delas parecia super estressada. Havia alguma coisa ali que não me estava convidando a participar desse estilo de vida.” – Kate

“Meu irmão tem um casamento muito ruim. A relação dele com a mulher estava degringolando, e eles disseram ‘vamos fazer filhos, porque assim as coisas vão melhorar’, e tiveram uma filha. Dois anos depois disso eles se divorciaram. Meu irmão ama a filha dele, mas ao mesmo tempo ele fala que queria nunca ter tido essa filha.

Outra coisa: uma vez eu estava conversando com minha irmã e ela me falou que quando volta para casa à noite, vai buscar sua filha da creche e sua filha fala: ‘Eu queria voltar para a creche, eu me divirto mais lá’. Então acho que não quero ter filhos. As coisas pelas quais minha irmã passa são barra pesada. E o que meu irmão passou só veio confirmar isso.” – Cory

3. No caso das mulheres, a responsabilidade ambiental e social muitas vezes é levada em conta na decisão.

 

“Não ter filhos é uma atitude responsável. Em vez de simplesmente cumprir cegamente a expectativa da sociedade, para quem é isso o que você deve fazer, não ter filhos significa levar muitos fatores em conta. Eu penso em muita coisa.

Por exemplo, fui acampar no fim de semana e vi o lixo deixado por pessoas com filhos e que vai se acumulando no camping. Penso em coisas como níveis demográficos aceitáveis.” – April

“Estou muito preocupada com nosso mundo. Se eu for mais fundo na questão social, acho realmente que o mundo neste momento está contra a criança. Neste momento em nossa estrutura social, não é uma boa coisa ter filhos. Não temos como criá-los de modo saudável.” – Kate

“Eu era uma criança muito preocupada com o meio ambiente, e minha grande preocupação na época era o controle da população, então isso meio que determinou minha decisão de não ter filhos.” – Kim

4. …Enquanto as decisões dos homens tendem a ser motivadas por fatores internos.

 

“Não ter filhos é o resultado evidente de nossas escolhas. Quero poder viajar, poder fazer coisas que eu não poderia fazer se tivesse filhos. Ter filhos é apenas uma das muitas escolhas que a gente faz nesse número de malabarismo que é nossa vida. E é uma reação racional ao que significa ter um filho e ao impacto de ser pai sobre o resto de sua vida.” — Steve

5. As pessoas refletiram muito sobre o que significa ser pai ou mãe.

 

‘Podemos dizer que as pessoas que tomaram a decisão de não ter filhos refletiram mais do que as que decidiram tê-los. É uma decisão pensada, respeitosa, ética, honesta, boa, justa e, para muitas pessoas, a decisão certa.” – Bob

“Eu queria que isso fosse visto como uma decisão como outra qualquer.” – Barb

“Eu queria que mais pessoas pensassem em refletir sobre isso. Ou seja, queria que fosse normal decidir se você vai ou não ter filhos.” – Tony

O que guardar em mente em relação a este pequeno estudo

A psicóloga clínica Nancy Molitor, professora assistente de psiquiatria clínica e ciência comportamental na Escola Feinburg de Medicina da Northwestern University, elogiou Blackstone por mergulhar na decisão pouco pesquisada e compreendida da decisão de não ter filhos.

E achou interessante como o gênero da pessoa parece influir sobre seu processo de tomada de decisões.

Mas ela ressaltou que, em vista da amostra pequena e homogênea de entrevistados e do fato de eles não terem sido escolhidos aleatoriamente, é praticamente impossível tirar qualquer conclusão mais geral sobre a população maior sem filhos nos Estados Unidos e no mundo.

Por exemplo, os padrões de gênero observados por Blackstone precisam ser validados e confirmados em uma população muito maior. Um pouco disso é inerente em uma pesquisa qualitativa, que não conta com as amostras randomizadas e o grupo de controle que fazem parte das pesquisas quantitativas.

Mas as pesquisas qualitativas ainda assim ocupam seu lugar próprio na ciência, especialmente em tópicos emergentes, porque são capazes de elevar o perfil de novas ideias, formular perguntas e gerar novas hipóteses a serem pesquisadas futuramente.

“Este é um grupo pequeno, autosselecionado”, disse Molitor. “Não quer dizer que não seja interessante, mas é difícil especular se estes resultados se reproduziriam em uma amostra maior de pessoas tiradas da zona rural do Mississipi ou do meio-oeste, por exemplo.”

Ela pediu que sejam feitos estudos de longo prazo para verificar se as pessoas na casa dos 40 anos sem filhos (a idade máxima dos entrevistados no estudo de Blackstone) mudam de ideia quando chegam à casa dos 50.

E achou que seria interessante levar adiante a pesquisa sobre a comunidade de pessoas sem filhos, examinando diferenças regionais e geracionais em uma amostra maior e randomizada da população.

“Muitas das pesquisas sobre pessoas sem filhos datam dos anos 1990”, explicou Molitor. “Posso afirmar a partir de minha própria experiência e pesquisas que estudos feitos nessa década, e as decisões sobre não ter filhos tomadas naquela época, podem divergir muito de uma mulher jovem da geração do milênio e que está tomando essa mesma decisão em 2016.”

Desde que publicou sua pesquisa na The Family Journal, Blackstone já entrevistou mais 44 pessoas, ampliando a diversidade de seu pool para além dos participantes em sua maioria brancos, heterossexuais e de classe média ou alta que fizeram parte de seu coorte original.

Ela espera continuar a desacreditar mitos e premissas sobre pessoas sem filhos com suas pesquisas futuras, na esperança de que ajudem a criar um mundo em que as pessoas sem filhos não precisem defender sua decisão diante de outros ou sofrer consequências sociais por ela.

A própria Blackstone não tem filhos. Ela comanda um blog que fundou com seu marido, intitulado “We’re {not} having a baby!” ({Não} vamos ter um bebê!).

“As pessoas não sabem o que fazer conosco”, ela disse. “Às vezes não nos convidam, por exemplo, para eventos nas casas de amigos em que haverá crianças, porque as pessoas supõem que não vamos querer participar. Às vezes é uma vida um pouco solitária.”

Imagem de capa: Shutterstock/GagliardiImages

TEXTO ORIGINAL DE BRASILPOST






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