Marcel Camargo

Não se vender também tem seu preço

Talvez seja parte da natureza humana a necessidade de obter controle sobre o mundo à nossa volta, sobre as pessoas com quem convivemos, numa vã tentativa de equilibrar o tanto de incertezas que nos rodeiam, uma vez que, na verdade, não conseguimos controlar muita coisa. E é assim que muitos de nós acabamos extrapolando os limites do outro, querendo que ele aja, pense e fale exatamente o que quisermos. E haverá um preço para tudo nesta vida, que jamais deixará de nos trazer a fatura das consequências.

Há um preço alto a ser pago pela autenticidade. Viver as próprias verdades, de acordo com o que se possui dentro de si, mesmo que de maneira digna, sem interferir na vida de ninguém, custa caro. A sociedade dita padrões de comportamento que devem ser seguidos, ou sofreremos olhares de reprovação e seremos alvo de julgamentos e de incompreensão por parte, na maioria das vezes, de gente que nem nos conhece direito.

Paga-se caro por amar sem medo. Caso a forma com que nos lancemos ao encontro afetivo não se adeque aos padrões preconizados como morais ou corretos – até mesmo em nome de um Deus isento de amor -, enfrentaremos um caminho penoso de rejeição, de preconceito, pois ainda existem muitas pessoas intrometendo-se onde não são chamadas, confundindo sentimento com barganha e amor verdadeiro com sacanagem, paradas que se encontram no tempo e no espaço.

Dizer o que se pensa também custa caro. Em tempos de comunidades e redes sociais virtuais, estamos todos sendo vitrines de milhares de pessoas, ou seja, postar algum comentário não mais lembra a quando comentávamos algo numa roda de amigos. Porque, por mais que o mundo evolua, muitas pessoas ainda não aprenderam a ouvir o que não lhes agrada, nem toleram conviver com quem pensa diferente, sem ofender com violência e sarcasmo.

Também alto é o preço por sermos cá fora quem somos aqui dentro de fato. E, quanto mais coragem tivermos de buscar o que nos alimente a alma, quanto mais fortes formos e mais certos de nossas convicções, de nosso comportamento, de nossas atitudes, mais seres desgostosos encontraremos pelo caminho, prontos para nos atirar pedras. Sempre haverá quem não é feliz, não quer ser feliz, não suporta ver o outro feliz e teremos que aprender a lidar com isso.

Sim, seremos colocados de lado, criticados, perderemos oportunidades, perderemos pessoas, enquanto estivermos caminhando com o propósito de buscar a felicidade de uma forma que foge ao lugar comum dos manuais retrógrados das convenções sociais. No entanto, é assim – somente assim – que poderemos ter condições de nos manter em pé durante cada tombo, porque então teremos conosco quem nos ama com aceitação verdadeira.

Imagem de capa:  NinaMalyna/shutterstock

Marcel Camargo

"Escrever é como compartilhar olhares, tão vital quanto respirar".

Recent Posts

Demorou dois anos pra estrear — e bastou uma semana na Netflix pra virar sensação nacional

Com roteiro baseado em um sucesso do Wattpad e fãs esperando há tempos, Através da…

5 dias ago

Essa produção da Netflix tem menos de 90 minutos — e vai bagunçar sua cabeça por dias

Charlie Kaufman não faz filmes para assistir no piloto‑automático. Em Estou Pensando em Acabar com Tudo…

5 dias ago

Parece só mais um drama comum… até você perceber que está emocionalmente destruída no último episódio (imperdível)

Tem filmes que não precisam gritar para esmagar seu emocional. Pieces of a Woman, disponível…

5 dias ago

Estado psicológico de um time: você precisa checá-lo antes de uma aposta?

Nas apostas esportivas, o acesso a estatísticas e a interpretação de estatísticas nunca foi tão…

2 semanas ago

Nova série sobre Bolaños expõe que o criador de Chaves “não era um santo”, diz diretor

Quando uma biografia televisiva chega, ela mexe em memórias afetivas e também em gavetas que…

2 semanas ago

Desviar o olhar é mentira, vergonha ou timidez? Psicólogos revelam o que isso indica

Alguns segundos de silêncio acompanhados de olhos que escapam para a lateral podem mudar o…

2 semanas ago