Categories: Sem categoria

Parem de banalizar o “eu te amo”

A banalização de qualquer coisa, infelizmente, acaba por tornar aquilo invisível, descaracterizando-lhe a força, a importância, tornando lugar comum o que deveria ser especial. É assim com fatos, com objetos, é assim com sentimentos. E é o que vem ocorrendo em relação ao amor, que parece estar perdendo a grandiosidade de seus domínios, de sua dimensão mágica e especial, uma vez que, hoje, diz-se “eu te amo” para qualquer um, em contextos banais e cotidianos.

Tempos atrás, a gente guardava a explicitação do amor para o momento em que ele não cabia mais aqui dentro do peito, quando já tínhamos tateado os terrenos incertos que adentrávamos ao nos relacionarmos com alguém. Dávamos tempo ao tempo, conhecendo o outro e nos reconhecendo junto dele, sentindo e refletindo cada momento, cada dia, sentindo o gradativo intensificar-se das batidas de nosso coração ao lado de nosso parceiro.

O amor era tão especial, que não ousávamos expressá-lo para qualquer um, em qualquer situação, muito menos para alguém que conhecíamos há pouco tempo. Entendíamos que o amor vai sendo construído ao longo da jornada, aos poucos, enquanto o que a gente doava se ia retornando, enquanto sentíamos que ali havia reciprocidade e verdade. Escrevíamos “eu te amo” às escondidas, nos cadernos e diários, como um tesouro afetivo que só seria dividido com a pessoa certa, aquela que ficou e se demorou perto da gente.

Hoje, por outro lado, vemos jovens escrevendo e dizendo “eu te amo” para amigos que acabaram de conhecer, para os recentes paqueras, muitas vezes para gente com quem não possuem nem um mínimo de intimidade. Parece que o amor vem se tornando um sentimento qualquer, que surge assim do nada, sem necessidade de que seja trabalhado, suado, vivido e revivido continuamente, sedimentado com o passar do tempo. Banaliza-se o amor, diminuindo-lhe toda a carga afetiva, toda a magnitude de que se reveste.

É preciso atribuir ao amor sua verdadeira intensidade, sua devida importância, entendendo que ele é um sentimento único, especial, que se alimenta de transparência e de retorno sincero, de permanência e de cumplicidade íntegra, de luta, de maturidade, de mãos dadas e firmes, que não se soltam por qualquer coisa. Parem de banalizar o “eu te amo”, parem de esvaziar o preenchimento emocional de que o amor se vale, ele não pode cair no marasmo da nulidade, ele não merece ser relegado ao lugar comum do que passa sem ser visto, sorvido, regado.

Quanto mais valorizarmos o amor, mais forte ele se tornará e mais capaz de resistir e de sobreviver a essa futilidade que permeia a sociedade atual, que torna tudo obsoleto em pouco tempo. Amor não envelhece. Amor não cai em desuso. Amor é vida.

Imagem de capa: Milles Studio/shutterstock

Marcel Camargo

"Escrever é como compartilhar olhares, tão vital quanto respirar".

Recent Posts

Demorou dois anos pra estrear — e bastou uma semana na Netflix pra virar sensação nacional

Com roteiro baseado em um sucesso do Wattpad e fãs esperando há tempos, Através da…

4 dias ago

Essa produção da Netflix tem menos de 90 minutos — e vai bagunçar sua cabeça por dias

Charlie Kaufman não faz filmes para assistir no piloto‑automático. Em Estou Pensando em Acabar com Tudo…

4 dias ago

Parece só mais um drama comum… até você perceber que está emocionalmente destruída no último episódio (imperdível)

Tem filmes que não precisam gritar para esmagar seu emocional. Pieces of a Woman, disponível…

4 dias ago

Estado psicológico de um time: você precisa checá-lo antes de uma aposta?

Nas apostas esportivas, o acesso a estatísticas e a interpretação de estatísticas nunca foi tão…

1 semana ago

Nova série sobre Bolaños expõe que o criador de Chaves “não era um santo”, diz diretor

Quando uma biografia televisiva chega, ela mexe em memórias afetivas e também em gavetas que…

2 semanas ago

Desviar o olhar é mentira, vergonha ou timidez? Psicólogos revelam o que isso indica

Alguns segundos de silêncio acompanhados de olhos que escapam para a lateral podem mudar o…

2 semanas ago