SAÚDE MENTAL

Fotos e atitudes na rede social dão pistas de sua saúde mental

Por Dr. Cristiano Nabuco

Já não é de hoje que sabemos que muita gente se utiliza das redes sociais para divulgar uma série de acontecimentos da vida, certo? Também não é novidade alguma que muitas delas usam desse recurso para passar uma imagem de si mesmos, digamos, um pouco “melhorada” de certos momentos pessoais de baixa e, assim, algumas vezes, poder disfarçar o isolamento e a insatisfação sentida.

Já se tem conhecimento, inclusive, que, de uma maneira geral, a cada 10 fotos que são postadas nas redes sociais, 8 são (exaustivamente, diga-se de passagem, em alguns casos) retocadas para produzir uma melhor impressão aos demais.

Pois bem, o que ninguém sabia ainda é que um olhar mais atento desses comportamentos pode revelar aspectos da vida privada bastante importantes e que, muitas vezes, fogem do controle consciente do usuário.

Num estudo recente, por exemplo, utilizando-se de um programa de computador, foram analisados traços e características de cerca de 44 mil fotos postadas no Instagram e constatou-se que as pessoas que não estavam bem (sofriam de depressão), naturalmente exibiam uma preferência inconsciente para usar em suas postagens cores mais melancólicas e escuras (como o azul, preto e branco), o que, claramente, retratavam seu estado emocional, se comparadas àquelas em que a depressão não estava presente (onde as fotos eram mais brilhantes e as cores vivas, mais abundantes). (1)

Para os pesquisadores, era como se a escolha das cores mais sóbrias deixassem escapar o estado emocional de descontentamento vivido, como se estivessem se sentindo com “uma nuvem escura sobre a cabeça”, afirmam os pesquisadores.

As fotos postadas por esses indivíduos também revelavam outro ponto bastante interessante: se comparadas às das pessoas sem depressão, revelavam as menores taxas de exposição do rosto ou da face, o que, possivelmente, interpretam os cientistas, denotava menor disposição em criar alguma forma de contato social. Dito em outras palavras, é como se esses usuários não deixassem de publicar, mas, sem que percebessem, se “protegiam” de um contato a mais com as pessoas.

Dessas 44 mil fotos estudadas, o software exibiu uma precisão de 70% de detecção da depressão, o que poderia, inclusive, servir de uma importante ferramenta de autocuidado.

Pensando um pouco mais a frente

Mais do que se imagina, portanto, um olhar mais cauteloso detecta pistas visuais dos usuários das redes sociais e o que, muitas vezes, apontam outras investigações, mostram muito além das postagens.

Outra pesquisa já havia concluído que as pessoas que se sentem mais inseguras em seus relacionamentos são aquelas mais ativas nas redes sociais, ou seja, são, entre todos os usuários, as que publicam atualizações pessoais mais frequentes, comentam posts mais intensamente e, finalmente, são as que mais visitam a timeline dos demais, distribuindo generosamente seus “likes”, na esperança de obter algum tipo de atenção. (2)

Acabou por aí? Nem pensar! Um estudo da Universidade Estadual de Ohio sugeriu que os homens que publicam mais fotos de si mesmos em mídias sociais como, por exemplo, no Facebook, são exatamente aqueles que obtêm as pontuações mais altas nas medidas de narcisismo e de psicopatologia. (3)

Bem, exemplos não faltarão, só dar uma boa olhada em outras investigações. (4)

Portanto, tudo o que você faz na internet, naturalmente deixará um rastro notório de sua dinâmica pessoal mais íntima.

Conclusão

Muito embora as redes sociais tenham se disseminado amplamente entre as pessoas e, mais do que nunca, se tornado parte cotidiana da vida diária de milhões ao redor do mundo, o comportamento que exibimos nas redes pode dizer muito mais do que ingenuamente poderíamos supor. (5)

Dizem alguns que, antes da invenção das redes sociais virtuais, pensávamos antes de nos comunicar, mas hoje, dada a velocidade das coisas na internet, agimos (ou melhor, digitamos) primeiro para depois pensar (filtrar), o que pode, sem dúvida alguma, dar margem a revelações que não são interessantes de serem desvendadas e, consequentemente, percebidas pelos demais. (6)

Minha dica: Da próxima vez, antes de postar qualquer coisa que seja, pense um pouco mais. Não aja por impulso.

Tenho certeza que uma avaliação, um pouco que seja, mais ponderada, vai ceifar a metade dos comentários e comportamentos que você exibiria (inconsequentemente) na web.

Pense nisso.

O que você faz na vida digital, concluindo, pode retratar muito mais do que apenas as fotos e as preferências que deseja compartilhar.

Referências

(1) https://epjdatascience.springeropen.com/articles/10.1140/epjds/s13688-017-0110-z

(2) http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0191886914007247

(3) http://www.huffpostbrasil.com/entry/selfies-narcissism-psychopathy_n_6429358

(4) https://www.theguardian.com/technology/2012/mar/17/facebook-dark-side-study-aggressive-narcissism

(5) http://www.smartinsights.com/social-media-marketing/social-media-strategy/new-global-social-media-research/

(6) https://www.harpercollins.com/9780062020444/is-the-internet-changing-the-way-you-think

Imagem de capa: Shutterstock/Burdun Iliya

Cristiano Nabuco

Grupo de Dependências Tecnológicas do Programa Integrado dos Transtornos do Impulso (PRO-AMITI) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Home-page: www.dependenciadeinternet.com.br / www.proamiti.com.br E-mail: cristianonabuco27@gmail.com Tel: (55 11) 2661-7805 Tel: (55 11) 3257-8102 (Direto)

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