Na longa jornada da vida, todos nos deparamos com variedades previstas, desejadas inclusive, e outras, nem tanto. Encontramos flores e pedras, subidas, curvas, rios, ladeiras e uma porção de espinhos. Se pudermos apurar o olhar para enxergar o que não é óbvio, entretanto, será possível observar um movimento diferente por detrás daquele arbusto na beira do caminho, ou sentir um sopro fresco justamente no momento do sol a pino.

São possibilidades de refúgio e descanso, fundamentais para seguir adiante. A esses oásis colocados estrategicamente em locais mais críticos, costumo chamar de amigos. Depois que “inventaram” o romance, a humanidade passou a valorizar demasiadamente o amor erótico e romântico, em detrimento do amor fraterno (conceitos de Erich Fromm em “A Arte de Amar”). Sim, toda a forma de amor é justa, como diria Lulu Santos; mas aqui, nesse artigo, quero falar um pouco sobre os mil amores que cabem no amor de amigo.

Como é importante encontrar esses pontos de aconchego no meio das tempestades! Quando a água de fora se mistura com a água de dentro deixando o olhar molhado, embaçado e míope para o que está por detrás da vidraça, o amigo aparece com capa e para-brisa e ajuda a clarear a paisagem: “está vendo aquela nuvem negra? Ela não é capaz de tampar o sol radiante por muito tempo.”

Em alguns momentos, o barulho frenético das buzinas e apitos também se confundem com as vozes internas que julgam, apontam e destroem sonhos antigos. A gritaria silenciosa que nos povoa em momentos incertos, acaba provocando confusão e solidão. Aquele rosto compassivo vem nos ensinar a termos compaixão por nós mesmos, também. Diferente da auto-piedade, esse acolhimento sobre nossos próprios erros e dores é estímulo para os processos de mudança e melhoria que devemos passar. Como esse olhar de amor traz sementes de novas esperanças!

Falando em amor – no bom e velho amor que todos buscamos – diria que é na amizade pura e desinteressada que o amor verdadeiro tem mais tranquilidade para se manifestar. Ele nos devolve a dignidade, nos personaliza, nos identifica com os pedaços que parecem ter ficado no caminho e diz que é possível recomeçar, que vale a pena quebrar-se para reconstruir-se melhor e mais forte. Apesar de não ser fácil ou indolor, existem processos necessários para a conquista do amadurecimento e felicidade que tanto queremos.

Quantas lágrimas cabem na mão de um amigo? Quantos risos em seus olhares, quantas partilhas, quantos empurrões, apelos, apertos, abraços? Parecem haver infinitos caminhos no caminho percorrido, quando um amigo lhe apoia e encoraja, quando as derrotas e vitórias têm o olhar – testemunho de alguém que sabe chorar e sorrir contigo. No final das contas, às vezes é só disso que precisamos: uma testemunha da nossa vida para termos alguma sombra de segurança quando os passos vacilam. Alguém que saiba ser forte e corajoso para suportar o nosso sucesso, assim como disponível para persistir conosco em tempos de lamúrias.

Não se engane se, ao ler essas linhas, seu coração achar que não encontrou alguém com todas essas características. A vida é múltipla e diversa, e cada uma dessas qualidades pode ser encontrada em diferentes rostos, em novos sorrisos. É preciso, contudo, ter coragem e ousadia para procurar e se abrir a esses anjos sem asas, sempre que possível. Sem eles, a caminhada perde um pouco das cores e dos temperos da vida.

Para os mais desolados e solitários do caminho, deixo aqui uma possibilidade de reflexão: é você esse amigo para os seus amigos? Você consegue esquecer de si mesmo em certos momentos para que o outro brilhe e apareça? É capaz de perceber o olhar opaco, o ombro caído, a voz molhada? Antes de querer ter, queira ser o anjo na caminhada dos que estão próximos a você. Quando menos esperar, verá que deixou pequenas surpresas na estrada, que se manifestarão por detrás do arbusto ou na brisa suave do meio-dia.

Milena Carbonari Krachevski

Milena Carbonari Krachevski Psicóloga com 10 anos de experiência em RH, especialista em Educação e Terapia Sexual pela Unisal SP.

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