Por que o mercado costuma empregar psicopatas como chefia

Por Jessica Brown

Olhe em volta em seu escritório. Você classificaria algum de seus colegas como um psicopata? Ainda que o termo seja mais associado a descrições cinematográficas de matadores a sangue frio como Hannibal Lecter e Dexter Morgan, há evidências de que há muitos psicopatas no ambiente de trabalho.

Estudos indicam que até um em cada cinco pessoas em postos elevados ou conselhos de empresas estão escondendo tendências psicopatas usando alguns traços de personalidade para atrair e manipular pessoas e conseguirem o que querem.

Uma pesquisa do psicólogo Paul Babiak, baseado em Nova York, mostra que até 4% dos líderes de negócios nos Estados Unidos poderiam ser considerados psicopatas. Outro estudo sobre gerentes de logísticas indica que entre 3% e 21% deles sofrem de psicopatia. A prevalência da doença mental na população em geral é de 1%.

Esses números expõem um cenário de líderes de negócios que colocam sua ambição acima de tudo e não têm escrúpulos na hora de usar as pessoas para sua própria vantagem. Seria um perfil vencedor no mundo corporativo. Mas a ciência tem questionado a ideia de que psicopatas possam ser tão apropriados para as salas de reunião como sugeriram pesquisas anteriores.

Questionando premissas

Gerentes de fundos de investimentos com características psicopatas tiveram uma performance pior que seus colegas, segundo um novo estudo da Universidade de Denver e da Universidade de Berkeley. Eles compararam traços de personalidade de 101 profissionais dessa área com seus investimentos e retornos financeiros entre 2005 e 2015 e concluíram que os com mais tendências psicopatas produziram os piores resultados.

Leanne ten Brinke, principal autora da pesquisa, acredita que esteja na hora de repensar velhas premissas de que ser frio e impiedoso sejam características positivas de chefes e gerentes. “Nossos resultados são consistentes com outra pesquisa que sugere que pessoas com mais traços psicopatas tenham capacidade para falar a coisa certa mas não para fazer a coisa certa”, diz ela.

Psicopatas têm uma probabilidade maior de chegar ao poder através de dominação, bullying e intimidação em vez de por respeito, diz ela. “No entanto, conquistar poder não é o mesmo que exercê-lo de maneira eficaz”.

Pesquisas indicam que psicopatas frequentemente deixam para trás um rastro de caos. Um CEO psicopata de uma organização de caridade, por exemplo, causou uma rotatividade maior de funcionários e uma queda na receita. Outro estudo apontou que, apesar de seu charme, psicopatas provocam comportamentos contraproducentes, bullying e conflitos no local de trabalho, assim como menor satisfação dos funcionários.

Ainda assim, há alguns postos onde ser um psicopata pode ser bom. Kevin Dutton, pesquisador de psicologia da Universidade de Oxford e autor do livro A Sabedoria dos Psicopatas, afirma que além de ter as habilidades certas para o emprego, a personalidade também tem uma importância grande sobre como alguém vai se comportar no local de trabalho.

“Você precisa do tipo certo de personalidade para permitir que você opere determinado conjunto de habilidades de maneira otimizada”, diz. “Algumas profissões requerem níveis mais altos de traços psicopatas, de uma maneira que pessoas sem a doença não se sentem confortáveis no cotidiano”.

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Uma forma comum de verificar a presença de traços psicopatas nas pessoas é usar uma avaliação conhecida como Lista Hare de Psicopatia. A lista mostra itens que podem causar tanto a destruição quanto a promoção em um local de trabalho.

Charme superficial

Psicopatas frequentemente são considerados charmosos, envolventes e graciosos devido a uma falta de autoconsciência que os liberta de inibições e preocupações sobre dizer a coisa errada. Enquanto as demais pessoas parecerem esquisitas socialmente, psicopatas parecem sempre confortáveis na interação social.

Estudos apontam que executivos com mais traços psicopatas tendem a serem vistos como carismáticos, criativos e bons comunicadores. Isso porque o charme psicopata pode se sobrepor a questões de comportamento, segundo um estudo feito em 2010 por Babiak. A pesquisa apontou que aqueles com níveis mais altos de psicopatia tinham avaliações de performance piores, mas eram associados com boas habilidades de comunicação, pensamento estratégico e criatividade.

Impulsividade

Há uma forte ligação entre psicopatia e impulsividade disfuncional, incluindo comportamento criminal e violento. Mas isso também pode significar que psicopatas têm uma tendência a se envolver em comportamentos arriscados sem pensar nas consequências. Sua impulsividade se deve a uma falta de medo, segundo o psicólogo criminal David Lykke.

Enquanto isso pode prejudicar os outros, essa impulsividade também pode ser uma força do bem. Pesquisadores encontraram uma ligação entre psicopatia e heroísmo, por exemplo ao ajudar alguém em uma situação perigosa.

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Adrian Furnham, professor de psicologia da University College London, escreveu em um artigo publicado no site Psychology Today que pessoas altamente impulsivas podem se dar bem em ambientes acelerados, como em um trabalho com ritmo muito rápido, mas elas também falam e tomam decisões sem pensar nas consequências antes.

Correr riscos combina com empreendedorismo, de acordo com uma pesquisa da Universidade de Cambridge. Experimentos com 16 empreendedores mostraram que eles tinham um comportamento mais adaptável e com uma tendência a se arriscar que os ajudava na hora de tomar decisões rapidamente em situações estressantes.

Falta de remorso

É comum pensar que psicopatas não sentem culpa ou remorso, mas pesquisas recentes indicaram que eles são sim capazes de sentir essas emoções. Os sentimentos, no entanto, se expressam apenas quando algo os atinge diretamente. Em outras palavras, se eles prejudicarem outra pessoa, não vão se corroer em culpa como outra pessoa poderia fazer, mas se a situação os prejudica financeiramente, por exemplo, eles podem sentir remorso.

Uma série de estudos em 2014 indicaram que aqueles com tendência a sentir culpa tendem a evitar relacionamentos interdependentes com outras pessoas que eles veem como mais competentes que eles. A razão para isso é que a possibilidade de não contribuir o suficiente para a relação pode fazê-los sentir culpa.

Mas, claramente, há também o lado positivo de sentir culpa. Pesquisas também apontaram que quando pessoas que tendem a sentir culpa têm esse tipo de relacionamento, elas se esforçam mais para evitar decepcionar o outro. Um estudo do Departamento de Economia da Universidade de Stanford também indicou que a culpa pode servir como motivador. Isso também pode guiar as pessoas na hora de evitar fazer algo que é errado legal ou moralmente. Psicopatas sabem discernir intelectualmente o certo do errado, mas eles não sentem a diferença.

Estilo de vida parasita

Outra característica chave do psicopata é que eles geralmente criam relacionamentos curtos e superficiais com outras pessoas antes de descartá-las sem cerimônia.

“Psicopatas geralmente tentam fazer algo bem feito para eles mesmos, mas não necessariamente para as pessoas para quem trabalham”, diz Galynker. “Eles são muito bons em dar uma boa impressão, ser promovidos e conseguir um aumento de salário, mas não são necessariamente bons como gestores. Eles só são aplicados em uma empresa se isso é necessário para que eles sejam promovidos ou consigam mais dinheiro”.

Pessoas que se comportam de acordo com seus próprios interesses podem ser vistas como mais dominantes mesmo comparadas com pessoas que contribuem mais, segundo uma série de experimentos da Faculdade Kellogg de Administração. Mas o interesse próprio precisa ser balanceado com altruísmo, diz o pesquisador Robert Livingston.

“Se você é muito delicado – não importa quão competente e capaz você seja – as pessoas podem não respeitar sua autoridade”, diz ele. “Mas se você só tem dominação, não tem boas ideias e usa a força para se manter no poder, então as pessoas irão detestá-lo. Ser um bom líder demanda ter ambos, dominação e prestígio”.
O contexto certo

Enquanto claramente há algumas características que podem ser ruins para o negócio, o impacto das características de personalidade podem depender do contexto.

“Se traços psicopatas são úteis vai depender do contexto”, diz Livingston. “Ser impiedoso não é algo errado mas no contexto errado pode se tornar crueldade. Não ter medo também pode ser uma vantagem, mas no contexto errado pode virar irresponsabilidade. O segredo é ter a combinação certa de traços nos níveis certos e no contexto certo”.

TEXTO ORIGINAL DE BBC






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