Psicologia da Tirania

Por S. Alexander Haslam e Stephen D. Reicher

Uma grande quantidade de pesquisas, incluindo experimentos controlados de laboratório, extensos levantamentos por questionários e observações de campo detalhadas, corrobora a abordagem da identidade social. Ainda assim, até recentemente, não havia um único estudo do tipo realizado por Sherif, Milgram e Zimbardo que pudesse ilustrar e combinar as várias proposições da teoria de modo amplo e convincente. Mais do que isso, parecia impossível realizar um estudo desses. Apesar de todas as dúvidas que pairam em torno do experimento de Stanford, sua própria radicalidade parecia tolher projetos nos mesmos moldes.

A situação mudou com o recente experimento do prisioneiro realizado pela BBC. Colaboramos com a pesquisa da British Broadcasting Corporation, que a financiou e televisionou em quatro documentários de uma hora cada.

Nosso primeiro desafio foi desenvolver procedimentos éticos para garantir que, apesar de sua intensidade, o estudo não causaria mal a seus participantes. Instituímos uma série de medidas de proteção, apoio psicológico em tempo integral e uma equipe de ética. Segundo as conclusões do relatório da equipe, mostramos que é possível conduzir estudos de campo dinâmicos com balizamento ético.

O experimento da BBC


Como no experimento de Stanford, o da BBC dividiu aleatoriamente guardas e prisioneiros em um ambiente construí-do especialmente para isso. O cenário era uma prisão, mas nosso objetivo era representar uma classe mais ampla de instituições – escritório ou escola – em que um grupo tem mais poder e privilégio que o outro. Acompanhamos o comportamento dos participantes através de câmeras escondidas e monitoramos seu estado psicológico com testes diários. O bem-estar de cada um foi medido pela quantidade de cortisol – um indicador de stress – coletado da saliva.

Apesar de termos seguido o mesmo paradigma do experimento de Stanford, nossa pesquisa era diferente em muitos pontos. Para estudar as dinâmicas de grupo sem interferir diretamente nessas interações, não presumíamos nenhum papel específico na prisão, ao contrário de Zimbardo. Além disso, manipulamos características de hierarquia que, de acordo com a teoria da identidade social, deveriam afetar a identificação dos prisioneiros com seu grupo e as formas de comportamento que eles adotariam em conseqüência disso. Mais importante, no entanto, foi que nós variamos a permeabilidade dos limites dos grupos, permitindo oportunidades de promoção de um prisioneiro a guarda, mas depois eliminando-as. Esperávamos que, com a possibilidade de promoção, os prisioneiros procurassem rejeitar sua identidade e trabalhassem para melhorar sua própria posição. Prevíamos que essa estratégia reforçaria o status quo e permitiria aos guardas manter ascendência sobre os prisioneiros. Depois de suprimida a possibilidade de promoção (no terceiro dia), achávamos que os prisioneiros começariam a colaborar entre si para resistir à autoridade dos guardas.

Os resultados confirmaram as previsões. Inicialmente, eles eram submissos e trabalhavam duro para melhorar sua situação. Passaram a se identificar como grupo e pararam de cooperar com os guardas apenas quando ficaram sabendo que continuariam a ser prisioneiros apesar de todo e qualquer esforço. Mais importante, essa identidade compartilhada levou a uma melhor organização, eficiência e bem-estar psicológico. À medida que o experimento avançava, os prisioneiros se tornavam mais confiantes.

TEXTO ORIGINAL DE MENTE E CÉREBRO






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