Quando o elogio vira um problema…

Por Thais Barros

Hoje muito se fala sobre a importância e dos “bons efeitos” de elogiar as crianças ao ensiná-las novas habilidades. Existem também importantes efeitos em relação ao desenvolvimento de sentimentos de autoestima (Guilhardi, 2002), porém, gostaria aqui de me referir aos elogios durante o processo de instalação de comportamentos.

Elogios são reforçadores positivos arbitrários verbais emitidos pelos pais, professores, educadores quando presenciam algum novo comportamento, ou uma conquista da criança. Quando os psicoterapeutas comportamentais orientam que as crianças sejam elogiadas estão, na realidade, instruindo que os adultos apresentem consequências aos comportamentos da criança de modo a aumentar a probabilidade de ocorrência de tais comportamentos. Ou seja, estão programando um manejo no ambiente com o objetivo de fortalecer os novos e desejados comportamentos, considerando que os elogios signifiquem satisfação, aprovação e incentivos para a criança.

Muitos pais, sabendo da influência positiva dos elogios sobre o comportamento dos filhos elogiam excessivamente e é aí que podem criar um problema. Reforçadores tem o poder de produzir sentimentos de bem estar, satisfação e consequentemente, saciação. Ou seja, elogios em excesso, ou aplicados a comportamentos simples, sem o cuidado de se aumentar gradualmente a exigência de modo a atingir avanços, podem enfraquecer a ação da criança por saciação (Guilhardi, 2011).

Assim, não haverá evolução de ações simples para repertórios mais complexos e amplos e a criança poderá se tornar dependente de tais reforçadores para se comportar, afinal, se não se dedica de modo suficiente para ter certo domínio sobre algo – a ponto de experimentar a satisfação por fazer algo bem – fica dependente da satisfação e aprovação do outro para fazer algo. Por exemplo, um filho excessivamente elogiado por jogar bem futebol quando joga com o pai – que gosta de futebol – pode se sentir confiante e menos desafiado a melhorar seu desempenho, se o pai não introduzir gradualmente maior dificuldade no jogo. Quando essa criança joga com outros colegas da escola e descobre que seu repertório não era tão bom quanto pensava, pode se sentir frustrada e pouco motivada a continuar jogando – situações frequentes do mesmo tipo podem, inclusive, levar a criança a não acreditar nos elogios quando estes vêm do pai, ou de outras pessoas que a amam.

Ao ensinar o filho a jogar futebol, o pai fez bem em elogiar e incentivá-lo (reforçadores arbitrários), mas à medida em que nota a melhora de desempenho do filho, deve deixar o jogo mais desafiador, de modo alcançável pela criança e adequar seus elogios. Ou seja, inicialmente o filho precisava de mais incentivos pois seu desempenho era baixo, à medida em que vai progredindo e notando sua própria melhora nas habilidades (reforçadores naturais), precisa menos de tais incentivos. Agora, o pai deveria elogiar somente repertórios um pouco mais complexos, ou seja, o filho precisa se comportar de modo mais vigoroso em relação a seu repertório inicial para ser elogiado. É importante que o pai adeque seu aumento de exigência ao repertório da criança, ou seja, se criou uma situação difícil demais a ponto de ficar inalcançável para o filho, deve diminuir o nível de dificuldade.

Assim, ao longo de um processo de aprendizagem de comportamentos complexos, elogios são bastante importantes, mas é fundamental que a criança fique sob controle das consequências reforçadoras naturais da atividade, desta forma, tais atividades se tornam prazerosas por si só e não precisam da mediação e alguém.

Alguns comportamentos do cotidiano podem levar tempo para se tornarem reforçadores por si só. Por exemplo, a sensação de frescor e boca limpa (reforçador natural) da escovação dos dentes pode demorar para ser notada pelas crianças, que inicialmente se comportam por seguimento da regra “escovar os dentes depois das refeições”. Neste caso, é importante que os pais facilitem o processo: com o uso de escovas de dentes de tamanho adequado e interessantes para a criança (reforçadores arbitrários), com creme dental infantil, de sabor mais suave (reforço natural); elogiem o comportamento de escovar os dentes (reforço arbitrário) e auxiliem a criança a notar a sensação de boca limpa, chamando a atenção para isso: “Que bom que você escovou seus dentes… Sinta que gostoso ficar com a boca refrescante”. Com o tempo, os elogios devem ficar intermitentes e ser minimizados.

Elogios são muito importantes, aprofundam o vínculo, fazem a pessoa se sentir importante e geram bem estar, mas todos esses efeitos acontecem quando os elogios são contingentes, genuínos e não subestimam a capacidade de quem o recebe.

Imagem de capa: Shutterstock/Ylia

Referências Bibliográficas:

Guilhardi, H. J. (2002). Auto-estima, autoconfiança e responsabilidade. In: M. Z. da S. Brandão, F. C. de S. Conte & S. M. B. Mezzaroba (Orgs), Comportamento Humano: Tudo (ou quase tudo) que você precisa saber para viver melhor. 29pp.Santo André, SP: ESETec.

Guilhardi, H. J (2011). A ética do reforçamento positivo. Disponível em: http://itcrcampinas.com.br/txt/reforcamentopositivo.pdf (acesso em 18.09.17)






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