A gente sempre acha que terá tempo de sobra…

Recentemente recebi um texto lindo por Whatsapp intitulado “Vá aos encontros felizes”. Nele, a autora, Monica Moro Harger, fazia uma bela reflexão acerca da necessidade de irmos ao encontro daqueles que amamos, aproveitando as boas oportunidades de nos reunirmos na alegria, e não somente nos momentos tristes. Como ela ressaltava, “nos encontros tristes você irá. Quando alguém morre, todos vão. Por protocolo, por obrigação ou por amor (e dor). Mas é bom que seja assim também, e, principalmente, nos momentos felizes”.

O texto de Monica é perfeito, singular, redondo. Não quero aqui acrescentar nada ao que ela já disse, pois seria desnecessário. O texto _ curto, certeiro e muito bonito_ é um alerta àqueles que acham que têm tempo de sobra, tempo demais para brindarem a vida junto àqueles que amam ou simplesmente abraçar as pessoas que lhes são caras. Infelizmente, a verdade é que nunca há tempo suficiente.

Tive um namorado “muito confiante” que dizia que teríamos o resto da vida juntos, e por isso priorizava os amigos à nossa relação. Certamente era uma desculpa dele, mas o fato é que escolhemos aquilo que queremos priorizar, e muitas vezes deixamos para depois pessoas e momentos importantes que nunca mais irão voltar. Meu namoro não durou, é claro, mas o fato dele achar que teríamos tempo de sobra no futuro, fez com que o presente fosse deixado de lado, e isso contribuiu para nosso rompimento.

Como eu disse, nós escolhemos nossas prioridades. Escolhemos colocar trabalho à frente de família, rede social à frente de amigos verdadeiros, sofá à frente de oportunidades de brindar à vida. Nos acomodamos em nossas desculpas e argumentos vagos e não percebemos que nem tudo estará ao nosso alcance por muito tempo. Os filhos crescem, as pessoas se despedem, os amigos vão embora, as oportunidades de abraçar aqueles que amamos se esgotam.

No primeiro fim de semana de agosto terei meu anual encontro de turma. Lá se vão vinte e dois anos de formados, e me reabasteço a cada reunião. Sinto orgulho dos colegas que viajam centenas de quilômetros para estarem conosco. Alguns vêm de avião, outros, acompanhados de seus filhos pequenos, cortam estados inteiros na estrada para passarmos dois dias juntos. Ano passado, um dos nossos grandes amigos saiu do hospital, depois de um infarto, direto para o encontro! No olhar de cada um, enxergo a resolução de que nossas reuniões sejam prioridade. Apesar do cansaço, dos afazeres, da vida corrida e da falta de grana, uma vez por ano reservamos um fim de semana para estarmos juntos. Uma vez por ano, abrimos mão de tudo que poderíamos estar fazendo e declaramos que o mais importante é rever nossa velha família e voltar a ser quem éramos aos vinte anos.

Doutora Ana Claudia Quintana Arantes, médica especialista em cuidados paliativos, cita que, entre os cinco maiores arrependimentos das pessoas antes de morrer, estão: “Eu gostaria de não ter trabalhado tanto” _ Ela conta que ouviu isso de todos os pacientes homens com quem trabalhou. Eles sentiam falta de ter aproveitado mais a juventude dos filhos e a companhia de suas parceiras_ e “Eu gostaria de ter ficado em contato com meus amigos”. Segundo Ana Cláudia, “muitos tiveram muitos arrependimentos profundos por não ter dedicado tempo e esforço às amizades. Todo mundo sente falta dos amigos quando está morrendo.”

Assim, acredito que quando você diz que “não tem tempo” para alguma coisa, na verdade você está dizendo que não escolhe aquilo como prioridade. Simples assim.

“Falta de tempo” já virou desculpa para muita coisa: desinteresse, desimportância, descaso, desapego. As pessoas reservam vagas na agenda para aquilo que acham que merece atenção, envolvimento, tempo. Nem sempre fazem escolhas acertadas, e um dia, tarde demais, podem perceber que privilegiaram coisas supérfluas às coisas importantes.

A gente sempre acha que terá tempo de sobra, mas a verdade é que ninguém tem. De uma hora para outra percebemos que o correr da vida nos engole por completo, e por isso é urgente não adiar nem tardar o perdão, as manifestações de afeto, a nossa presença plena e integral junto àqueles que amamos.

No dicionário, priorizar é definido como “privilegiar”, “garantir vantagem”. Que você privilegie as coisas certas, eternas, valiosas. Que dê vantagem àquilo que realmente é importante, que não pode ser ignorado, que é relevante demais para ser considerado segunda opção. Que nunca se engane com a ordem das coisas, e coloque em primeiro lugar o que torna-se primordial hoje e nunca, jamais, poderá ser resgatado depois.

Pois depois… Depois a casa fica vazia, as marcas na parede denunciando o crescimento do menino se apagam, as músicas do velho amor são substituídas por uma batida barulhenta nova. Depois a porcelana quebra, a prata escurece e os guardanapos de uma noite feliz voltam para a gaveta. Depois os quintais perdem o encanto, os porta retratos empoeiram e a certeza de que a visita do tempo é implacável se consolida.

Então não deixe para depois o que merece ser reverenciado, amado, vivido. Não adie as mãos dadas, o beijo de boa noite, a conversa de boteco, a receita de família enchendo a cozinha de vapores. Não recuse a bola no quintal, a oração na cama dos pequenos, o ritual de enxugar a louça enquanto sua mãe lava. Troque o sofá pelos “encontros felizes” e nunca se esqueça que a contabilidade que realmente importa é baseada nas experiências vividas, nos laços criados e nas prioridades assumidas.

*Imagem de capa: Rebecca Sehn






Escritora mineira de hábitos simples, é colecionadora de diários, álbuns de fotografia e cartas escritas à mão. Tem memória seletiva, adora dedicatórias em livros, curte marchinhas de carnaval antigas e lamenta não ter tido chance de ir a um show de Renato Russo. Casada há dezessete anos e mãe de um menino que está crescendo rápido demais, Fabíola gosta de café sem açúcar, doce de leite com queijo e livros com frases que merecem ser sublinhadas. “Anos incríveis” está entre suas séries preferidas, e acredita que mais vale uma toalha de mesa repleta de manchas após uma noite feliz do que guardanapos imaculadamente alvejados guardados no fundo de uma gaveta.