Você sabia que certos traços da sua personalidade podem influenciar diretamente sua qualidade de sono? Um estudo da Universidade de São Paulo (USP) revelou que características como instabilidade emocional e ansiedade estão fortemente ligadas ao risco de desenvolver insônia. Os resultados foram publicados na revista científica Journal of Sleep Research e acendem um alerta para o impacto da saúde mental sobre o sono.
A pesquisa foi conduzida pela psicóloga Bárbara Araújo Conway, como parte de sua tese de mestrado no Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP (FM-USP). “A insônia é um transtorno extremamente prevalente e que traz impactos negativos para a saúde física e mental, como hipertensão, diabetes, ansiedade e depressão”, explicou a pesquisadora à Agência Fapesp.
O que é insônia?
A insônia crônica é caracterizada por dificuldade para iniciar ou manter o sono, com queixas que ocorrem pelo menos três vezes por semana, durante três meses ou mais. No Brasil, estima-se que duas a cada três pessoas tenham dificuldades para dormir, e cerca de 15% da população apresenta diagnóstico formal do distúrbio, segundo dados do Instituto do Sono.
O papel da personalidade no sono
A partir da teoria dos “Big Five” — um modelo amplamente usado na psicologia para descrever a personalidade humana — os pesquisadores analisaram cinco grandes traços:
Neuroticismo
É o traço relacionado à instabilidade emocional. Pessoas com alto neuroticismo tendem a experimentar emoções negativas com mais frequência, como raiva, tristeza, frustração e ansiedade. Costumam ser mais sensíveis ao estresse e têm maior dificuldade para lidar com adversidades. O estudo mostrou que esse traço está diretamente ligado ao desenvolvimento da insônia.
Extroversão
Refere-se à tendência de ser sociável, comunicativo e enérgico. Pessoas extrovertidas gostam de interagir, participar de grupos e demonstram entusiasmo. Já aquelas com baixos níveis de extroversão preferem ambientes mais calmos e reservados. Apesar de não ter se destacado como fator central no estudo, esse traço também foi analisado.
Abertura à experiência
Diz respeito à curiosidade, criatividade e disposição para novas experiências. Pessoas com esse traço elevado costumam ser imaginativas, gostam de aprender coisas novas e têm mente aberta. Segundo o estudo, altos níveis de abertura foram associados a menos queixas relacionadas ao sono, ou seja, podem representar um fator protetor contra a insônia.
Amabilidade
Envolve a capacidade de empatia, cooperação e gentileza. Pessoas com altos níveis de amabilidade são mais solidárias e preocupadas com o bem-estar dos outros. No estudo, indivíduos com bons níveis desse traço relataram menos dificuldades para dormir.
Conscienciosidade
Está relacionada à organização, responsabilidade e autodisciplina. Pessoas conscienciosas costumam ser persistentes, comprometidas e planejam suas ações com cuidado. Elas também apresentaram menos problemas com o sono, o que pode ser explicado por hábitos de vida mais regrados.
Como foi feita a pesquisa?
O estudo contou com 595 participantes entre 18 e 59 anos, divididos em dois grupos: um com pessoas que tinham insônia diagnosticada e outro sem queixas de sono. Todos responderam a um questionário de personalidade com 60 perguntas. Os dados revelaram que:
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61,7% das pessoas com insônia apresentavam alto neuroticismo, contra apenas 32% no grupo sem insônia.
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Participantes sem dificuldades para dormir mostraram níveis mais altos de amabilidade, abertura e conscienciosidade.
Além disso, os pesquisadores descobriram que a ansiedade pode funcionar como um elo entre o neuroticismo e a insônia. Ou seja, pessoas emocionalmente instáveis tendem a ter mais ansiedade, o que impacta diretamente no sono.
O que isso significa na prática?
Segundo a professora Renatha El Rafihi-Ferreira, que orientou o estudo, os resultados podem ajudar a desenvolver tratamentos mais personalizados:
“Essas descobertas são importantes na prática clínica, pois ao receber pacientes com esse traço de personalidade é fundamental pensar em um plano de tratamento que foque não somente no sono, mas também na ansiedade”, explicou.
Dormir bem vai muito além de descansar
A pesquisa reforça que entender a própria personalidade pode ser um passo importante para melhorar a qualidade do sono. Se você se identifica com níveis elevados de estresse, preocupação constante ou instabilidade emocional, é importante buscar apoio profissional. Tratar a ansiedade e adotar hábitos saudáveis pode fazer toda a diferença.
