A caixa preta da ansiedade

Imagem: lassedesignen/shutterstock

Deitado na cama sem conseguir dormir, escuto o barulho da chuva que começa a cair. Ouço aquele som das gotas tocando o chão, o teto da casa e sinto como se cada gota daquela estilhaçasse o meu peito.

Como se cada gota que cai do céu fosse como um tiro que destroça a minha cabeça. A cada gota que cai e se perde, escuto o tique-taque do tempo em meus pensamentos, sinto-me finito, vazio, cansado.

Mas, apesar disso, sinto a dor que me aflige e diz que eu tenho que correr, embora, eu mal consiga levantar da cama. E a chuva que cai não lava a minha alma, pelo contrário, afoga-me ainda mais e sufoca-me na ansiedade, na dor silenciosa e escura que me prende no tempo das gotas de chuva.

O mundo é indiferente a mim. Os céus só me mostram nuvens escuras e carregadas. Ninguém me escuta. Ninguém me ouve. Ninguém me responde. Estou sozinho, triste, silenciado, perdido em mim mesmo, procurando um bom motivo para sair da cama.

Entretanto, eu saio, porque, embora viva em um mundo indiferente ao meu sofrimento, ele me cobra, exige performance, rendimento, sucesso e sorrisos. Exige que eu cale a minha dor, que eu aparente alegria e que eu reserve as lágrimas para os meus lençóis.

Você talvez se pergunte se eu não deveria reagir, sair dessa, viver. A verdade é que eu não consigo. Eu quero, não escolheria viver assim, de modo tão miserável. Mas, eu sinto que estou sempre correndo contra o tempo, mesmo que esse tempo só exista na minha cabeça. Não importa.

Ele corre atrás de mim, alcança-me, agarra-me, prende-me, sufoca-me, tira o meu fôlego. Nós precisamos respirar para continuar vivendo, todavia, eu pareço estar respirando por aparelhos que constantemente param de funcionar e me levam para um estado de morte.

Estou sufocado, estou fodido. Até mesmo em meu quarto, na minha cama, com as janelas abertas, não consigo respirar. As paredes parecem vir ao meu encontro, buscando de algum modo me esmagar. Eu tento me proteger como posso, mas estou frágil, cansado demais para lutar.

Pelo medo de não conseguir me proteger, passo as noites em claro e a insônia é uma companheira inabalável. Não há como dormir sabendo que a qualquer momento o teto desaba sobre você, não há tranquilidade, tampouco, paz; muito menos, riso, sequer sono.
O corpo possui tantas dores que já nem sei como se sustenta.

O espelho parece refletir o futuro ou somente mostra-me do avesso. Sou como uma cópia e às vezes tenho a impressão de que sou só uma cópia, de que eu mesmo desapareci. Talvez tenha apenas me escondido, mas isso são devaneios, pouco importa, porque não há como fugir dessa dor que me corta, que retira toda a energia do meu corpo e me impede de respirar.

Não sei mais o que dizer, nem o que pensar, porque estou perdido e não sei se você quer me encontrar. Entretanto, você também pode estar perdido, sufocado, com o peito esmagado, sentindo-se um miserável. Então, esse relato fará mais sentido para você, que sofre ou sabe que um dia poderá sofrer.

Eu não sei direito como começou, mas sei que ela está aqui e me atormenta, assim como, pode atormentar você. Essa é a minha história, é a caixa preta da ansiedade, da minha ansiedade, da sua. Que diferença faz? Amanhã, eu vou levantar da cama mesmo sem conseguir, vou fingir que está tudo bem e tentar me proteger das paredes do meu quarto ou do barulho da chuva.

Você provavelmente fará o mesmo, mas eu também não me importo. Somos todos indiferentes. Somos todos miseráveis. Estamos todos no fundo do poço. Estamos todos no vale das lágrimas.

Não quero mais me prolongar, nem tenho mais o que dizer. Mas, antes de que diga que você não tem a ver com a minha dor, o que é verdade inicialmente, digo que você tem a ver com a minha humanidade e eu com a sua, de tal maneira que na medida em eu a perdi, torna-se obrigação sua encontrá-la.

Todavia, sejamos sinceros: quantos de nós assumimos essa obrigação? Por isso, eu continuo perdido, você continua perdido, somos sufocados pela ansiedade, pelas cobranças de um mundo altamente exigente e na mesma medida indiferente, que nos aprisiona ou nos torna fugitivos, que não conhece o afago, tampouco, o ouvir.

Por isso a chuva cai, o tempo todo, e eu não sei se é real ou coisa da minha cabeça, mas sei que ela cai, grita, machuca, sangra e destrói. E o pior é que existem guarda-chuvas, mas eles nunca serão abertos, porque para que se abram é necessário mais que duas mãos e nós… ah! Nós estamos perdidos.






"Um menestrel caminhando pelas ruas solitárias da vida." Contato: [email protected]