A cultura patriarcal e a homossexualidade

É fácil observar que o corpo humano não é um ambiente neutro, mas complexo de manifestações e mutações. Por isso, algumas religiões buscam controlar o corpo na sociedade de acordo com seus interesses morais, sociais e econômicos.

Assim percebe-se que certas religiões, em pleno século XXI, têm influenciado com projetos conservadores, sobretudo no parlamento e na mídia, com objetivo de regular o controle do corpo em suas dimensões sexuais, impondo valores que causam desconfortos e conflitos na contemporaneidade.

Esse vigiar dessas religiões sobre o corpo pauta-se principalmente na homofobia, que sãos atitudes de repulsas aos homossexuais, que no Brasil são alvos quotidianos de preconceito e violência. Tais religiões reforçam a cultura patriarcal, usando uma leitura anacrônica do antigo testamento, gerando mal-estar ao lidar com a diversidade sexual.

É importante situar que a cultura patriarcal narrada no antigo testamento, ocorreu na idade antiga, que era um sistema de organização política, econômica, religiosa e social com severo domínio do corpo. Constituída numa hierarquia, na qual todas as posições superiores eram ocupadas por homens, que não consideravam os direitos das pessoas que fossem diferentes.

Mas a narrativa do novo testamento revela que Jesus corrigiu as estruturas opressoras das leis judaicas e romanas, denunciando os princípios que justificavam as forças da morte, e anunciou um projeto radical de amorosidade e generosidade, que reconhecia a existência da diversidade humana, dos pobres, velhos, crianças e mulheres, onde todos são bem-vindos, independente de religião, raça, classe e orientação sexual. E como disse o Papa Francisco sobre a homossexualidade: “Quem sou eu para julgar?” Insistindo que a Igreja não deve condenar as pessoas.

O preconceito contra a homossexualidade, na época de Jesus e até os dias de hoje, espalha uma ideia de que os homossexuais se relacionam com o único fim de fazer sexo. Se, na sociedade, o sexo é visto como pecado e sujeira, e se não é reconhecido o amor, a afetividade entre pessoas do mesmo sexo, as relações homossexuais são vistas erroneamente como relações de promiscuidade e perversão.

No tempo de Freud havia repressão aos críticos da cultura patriarcal vitoriana, onde foram perseguidos escritores, homossexuais, políticos e artistas. E foi nesse contexto que a mãe de um jovem homossexual escreveu uma carta ao psicanalista no intuito de que seu filho fosse “curado” por ele. Veja alguns trechos das respostas, que são igualmente válidas para os nossos dias: “Não tenho dúvidas que a homossexualidade não representa uma vantagem, no entanto, também não existem motivos para se envergonhar dela, já que isso não supõe vício nem degradação alguma”.

Freud vai mais além: “Não pode ser qualificada como uma doença e nós a consideramos como uma variante da função sexual, produto de certa interrupção no desenvolvimento sexual. É uma grande injustiça e também uma crueldade, perseguir a homossexualidade como se esta fosse um delito.” O que salta aos olhos é como – Freud – estavam à frente do seu tempo, no qual percebia que a homoafetividade rompia com o paradigma de que a homossexualidade estava restrita ao ato sexual. Mas que, a homossexualidade envolve relações afetivas entre pessoas do mesmo sexo, sem a ideia de pecado e doença.

Hoje a conquista do Estado de Direito e a sua laicidade, garante para todos, o dever de restaurar os seus direitos ameaçados, como forma de combater as desigualdades e as injustiças que buscam também “enquadrar” o corpo e a sexualidade conforme interesses obtusos e tacanhos. Portanto, vivemos numa era que nos traz o exercício da coexistência fraternal entre os seres humanos – com o reconhecimento da diversidade humana, contribuindo, desse modo, com uma sociedade justa, igualitária e livre.






Jackson César Buonocore Sociólogo e Psicanalista